Como a nanotecnologia pode diminuir o uso de agrotóxicos?
Data: 11 de dezembro de 2020.
Autores: Danilo Minto dos Santos, Letícia Sant'Anna Andrade, Matheus Willian Santos de Freitas, Marya Luísa Damasceno Oliveira, Ana Paula Bernardo dos Santos e Lívia Tenório Cerqueira Crespo.
Ilustradoras: Danilo Minto dos Santos, Letícia Sant'Anna Andrade, Matheus Willian Santos de Freitas e Marya Luísa Damasceno Oliveira.
Revisora: Lucineide Lima de Paulo.
Os agrotóxicos são produtos químicos sintéticos utilizados no controle de insetos, larvas, fungos e carrapatos com o intuito de evitar as doenças provocadas por esses vetores e também regular o crescimento da vegetação, tanto nos ambientes rurais quanto nos urbanos. Eles podem ser usados em diferentes atividades: nas agrícolas, aquelas voltadas às lavouras, à preparação do solo e à pastagem, e nas não agrícolas, direcionadas às florestas nativas e aos ecossistemas aquáticos, como lagos e açudes.
Esses tipos de substância podem ser divididos em diferentes tipos, dependendo da aplicação que se deseja. Os classificados como herbicidas são defensivos agrícolas responsáveis por combater as plantas daninhas. Estima-se que as perdas por esse tipo de planta indesejada seja de aproximadamente 90%, caso nenhum controle seja efetuado. Outra classificação é a dos inseticidas que, como o próprio nome indica, atuam como defensivos contra insetos. Já os fungicidas atuam para evitar que a plantação seja afetada negativamente por fungos.
Figura 1: Diferentes tipos de agrotóxicos.
Fonte: Escola Kids - Educação para Crianças, Conteúdo Infantil de Educação.
É de extrema importância pontuar que esses compostos não são apenas tóxicos para insetos e microorganismos. Os agricultores e funcionários das indústrias de agrotóxicos, por trabalharem no manuseio e confecção de tais químicos, sofrem diretamente com seus efeitos negativos. A população também está exposta aos agroquímicos, pelo consumo de alimentos e água contaminados. Assim, principalmente gestantes, crianças e adolescentes podem sofrer, devido a mudanças hormonais, malformações congênitas, nascimento prematuro, câncer e até mal de Alzheimer .
Em 2017 e 2018, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) analisou 14 alimentos de origem vegetal: abacaxi, alface, arroz, alho, batata-doce, beterraba, cenoura, chuchu, goiaba, laranja, manga, pimentão, tomate e uva. Esses alimentos correspondem a 30,86% dos consumidos pelos brasileiros. Foram selecionadas 4.616 amostras: entre elas, observou-se que 51% apresentavam resíduos de agrotóxicos.
O Brasil é o país com maior consumo de produtos agroquímicos nos últimos doze anos, por causa do desenvolvimento do agronegócio no setor econômico, ocasionando sérias consequências.
Figura 2: Brasil, maior consumidor de agroquímicos.
Fonte: Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz.
Observando o gráfico abaixo, pode-se perceber como esse aumento tem sido significativo com o passar dos anos.
Gráfico 1: Consumo de agrotóxico no Brasil de 2000 a 2018
Fonte: IBAMA / Consolidação de dados fornecidos pelas empresas registrantes de produtos técnicos, agrotóxicos e afins, conforme art. 41 do Decreto n° 4.074/2002.
De acordo com o último levantamento oficial no país realizado pela Anvisa, em uma década (de 2007 a 2017), houve quase 40 mil casos de pessoas com intoxicação aguda por agrotóxicos, das quais 1900 foram a óbito. Muitos desses agrotóxicos já foram banidos no mundo exterior, mas ainda são permitidos em território nacional. E há outros proibidos no país, mas ainda utilizados devido à venda ilegal. A exposição a essas substâncias pode desencadear diversos problemas à saúde, dependendo dos compostos utilizados na produção dos agrotóxicos, da quantidade de produto que foi absorvido pelo corpo e do tempo de exposição ao produto. Alguns exemplos de sintomas e distúrbios são: dores no estômago e na cabeça, náuseas, dor lombar, dificuldade de urinar, gastrite/epigastralgia, cólicas abdominais, dor muscular, ansiedade, irritabilidade e depressão.
Um agrotóxico muito utilizado no Brasil e proibido em diversos países é um herbicida conhecido como atrazina. A atrazina começa a se tornar tóxica em animais mesmo em pequenas quantidades, causando problemas como distúrbios hormonais, feminização de sapos machos e inflamação na próstata de ratos. Em humanos, pode causar risco de aborto espontâneo, baixa fertilidade masculina e aumento da chance de defeitos de nascença. O câncer também é um dos efeitos desse agrotóxico. Na primavera e no verão, esse agrotóxico é encontrado em maior quantidade na água de abastecimento da população, uma vez que a chuva carrega esse composto recém aplicado na lavoura aos corpos d’água próximos às plantações. Ademais, há a danificação da fauna aquática de alguns locais, uma vez que peixes e anfíbios são mais suscetíveis aos efeitos negativos do composto.
Sua utilização se dá antes e/ ou depois do aparecimento de plantas invasoras no cultivo da cana-de-açúcar, do milho, da soja e de outros alimentos. Assim, alguns estudos estão sendo feitos visando ao desenvolvimento de um projeto cujo objetivo é avaliar a capacidade que um sistema nanoestruturado tem no controle de pragas na agricultura. Para isso, o agrotóxico citado precisa ser encapsulado.
Ao encapsular a atrazina com nanopartículas de polímeros, que funcionam como uma cápsula de um remédio em escala nanométrica, ela passa a ser melhor absorvida pela planta, uma vez que a nanocápsula libera a atrazina em quantidades limitadas ao longo do tempo. Assim, o tempo de conservação da substância na superfície das plantas é melhorado, reduzindo a toxicidade contra organismos que não devem ser afetados, visto que a quantidade de atrazina nanoencapsulada utilizada será menor que a atrazina livre empregada.
Figura 3: Representação das nanocápsulas
Fonte: Ecolink Brasil.
Os pesquisadores explicam como funciona o processo de atuação das nanopartículas com as atrazinas aplicadas. Eles afirmam que o herbicida prejudica a produção de carboidratos através do bloqueio da fotossíntese da planta daninha. Isso ocorre porque, após ser absorvida pelas raízes, a atrazina chega até as folhas, onde ocorre a fotossíntese. Assim, além de melhorar a atuação do herbicida, a nanoatrazina também reduz a preocupação com a toxicidade no meio ambiente.
Essa redução acontece porque, em escalas nanométricas, a quantidade necessária do herbicida se torna bem mais baixa. Sem a nova tecnologia, a atrazina necessita ser reaplicada de duas a três a semanas, enquanto encapsulada a frequência é diminuída. Antes de usar a tecnologia, era liberado, no ambiente, cerca de 2 Kg/hectare; contudo, após o desenvolvimento da técnica por nanopartícula, reduziu-se essa quantidade a 0,2 Kg/hectare – ou seja, uma redução de 90%.
Mas, apesar de diminuir a concentração do composto no meio ambiente, essas nanocápsulas ainda passam por uma série de análises buscando respostas quanto à potencialidade dos riscos à saúde.
Contudo, a nanotecnologia não auxilia o setor alimentício apenas na plantação, ela pode estar presente em todo o processo dos alimentos e das bebidas desde o plantio até a sua mesa, ou da uva ao vinho. Quer saber mais? Aguarde nossa próxima nanocuriosidade!
Fontes:
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ANVISA é contrária a 'PL do veneno' e lista riscos de nove agrotóxicos proibidos. Seção: Saúde e Sustentabilidade. Centro de Estudos Estratégicos Fiocruz, Fundação Oswaldo Cruz - Rio de Janeiro, 2018. Disponível em: https://cee.fiocruz.br/?q=Anvisa-e-contraria-a-PL-do-veneno-e-lista-riscos-de-nove-agrotoxico-proibidos. Acesso: 9 dez. 2020.
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AVARES, Simone Sakagute. Avaliação da toxicidade da Atrazina livre e Atrazina nanoencapsulada no desenvolvimento e metabolismo mitocondrial em Drosophila melanogaster. 2019. 58 f. Dissertação (Mestrado em Ciências) – Curso de Bioquímica, Universidade de São Paulo - USP, Ribeirão Preto, 2019. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/17/17131/tde-13022020-104703/publico/SIMONESAKAGUTETAVARESco.pdf. Acesso em: 04 dez. 2020.
BARRETO, Roberto. Quanto menor, melhor. Nanopartículas e nanocápsulas poderão diminuir o uso de agroquímicos, mantendo a eficiência biológica. Seção: Eco Agro. Agência de Mídia Ecolink Brasil, 2018. Disponível em: https://ecolinkbrasil.com.br/index.php/2018/04/20/quanto-menor-melhor-nanoparticulas-e-nanocapsulas-poderao-diminuir-o-uso-de-agroquimicos-mantendo-a-eficiencia-biologica/. Acesso em: 9 dez. 2020.
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NANOTECNOLOGIA reduz em 10 vezes o uso de herbicida para controle de erva daninha do milho. Seção: Ciência e Tecnologia. Superintendência Geral de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior – Governo do Estado do Paraná, 2019. Disponível em: http://www.seti.pr.gov.br/Noticia/Nanotecnologia-reduz-em-10-vezes-uso-de-herbicida-para-controle-de-erva-daninha-do-milho. Acesso em: 04 dez. 2020.
SOUZA, Patrícia Moraes Sinohara; LOBO, Fabiana Aparecida; ROSA, André Henrique; FRACETO, Leonardo Fernandes. Desenvolvimento de Nanocápsulas de Poli-e-caprolactona Contendo o Herbicida Atrazina. Química Nova. São Paulo, v. 35, n. 1, p. 132-138, 2012. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-40422012000100024. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/qn/v35n1/v35n1a24.pdf. Acesso em: 04 dez. 2020.
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